Amigos leitores,se tem uma coisa perturbadora, capaz de sempre me fazer alimentar um sentimento de negatividade quanto ao destino da raça humana, isso tem a ver com o aumento da população de rua.
Pior do que qualquer buraco, ou pedra portuguesa estirada pelo chão, é encontrar pelas madrugadas os corpos mal encobertos por cobertores curtos, comprimidos e entregues a sabe lá de Deus que tipo de sorte.
Em comum com os mendigos,com a população maltrapilha que se espalha por todas as cidades, há o sentimento de exclusão.
Ainda que a comparação seja injusta, indevida em muitos aspectos, consigo pontuar com clareza alguns aspectos que nos unem. Pois, o sentimento de estar desconjuntado, fora do ritmo da vida, ainda me assola.
A pessoa com deficiência no Brasil rema contra uma maré constante de dificuldades. Para exigir coisas básicas, como poder circular pelas ruas,ter direito a melhores condições de trabalho,nós sofremos com a visão tacanha da política.Muitas vezes,ficamos submetidos a ações do governo que têm o mesmo efeito de uma esmola.
Estar invisível, pouco afeito ao processo de participação de um viver pleno, em ressonância com as demandas exigidas pela sociedade, é o risco que todos corremos caso aceitemos o peso da balança injusta.Porque muitas oportunidades ainda teimam em nos favorecer.
Quando preciso falar para alguém sair da vaga especial,quando peço para algum motorista que retire o seu veículo do lugar reservado ,ganho mais familiaridade com a rotina dos desalojados.
Só que ao invés de pão, eu clamo por um grão de consciência das pessoas.Porque nos falta uma lógica de integração.
Cada vez mais nos atinge a falta de uma visão sistêmica,capaz de analisarmos o país com maior humanidade.Estamos sempre divididos,conscientes das nossas ideologias.
Em tempos de recessão,onde até os reinos que eram unidos debandam por um esforço de separação,nós compactuamos apenas com quem pensa ,age e recebe dividendos de forma compatível com a nossa.
E,assim,muitos caminham,com larga insensatez e um colo de mãe feito para abrigar a própria intolerância.Não surpreende que aqui no Brasil se confunda Direitos Humanos com a defesa de bandidos.
Lógica miserável essa a que glorifica o padrão. Maldita toda e qualquer exaltação ao corpo ideal, ao carro que nunca teremos, ou a ausência de fraternidade por qual estamos sendo guiados.
Mesmo assim,nem tão certo,mas nem muito torto,eu prossigo.
Enquanto passo por alguém em situação de abandono, não faço muita coisa. Apenas procuro andar silencioso. Em situações assim, eu zelo pelo sono dos desassistidos como o amor nutrido pelos meus familiares.
Isso é muito pouco.
Eu queria me livrar dos andadores, das muletas que teimam em me perseguir .Pelo menos uma vez ,gostaria de erguer as mãos ao meus anônimos vizinhos,tão desprovidos de tudo.
Mais relevante do que qualquer campanha de inverno,visando a arrecadação de cobertores é a nossa luta, que almeja a consolidação de uma existência mais consciente e inclusiva.
Para que um dia nenhum de nós, em nenhum canto,ou avenida ,precisemos mendigar por aquilo que deveria ser obrigatório e justo.
Um abraço para todos,
André Nóbrega.