Para Yasmin Porto **
Antes
de mais nada, reconhecer o abismo a nos envolver. Saber olhar para o vazio,
para as falhas latentes, evidentes em nossas vidas, sem nos acomodarmos. E isso
não é tão fácil quanto aparenta.
Por muitas vezes, em inúmeras
ocasiões, após tantas promessas lançadas, ficamos asfixiados pelo impacto da
realidade. Não contribuem as sinalizações do governo atual. Tanto no episódio a
envolver a ameaça de extinção do CONADE, como na postura antidemocrática,
cerceadora de direitos, sinalizada por nossa ministra Damares .
Não
é um tempo fácil para os sonhadores, os artistas, os professores e quem ouse
sinalizar opiniões contrárias, dissonantes ao ímpeto da nova ordem
política. Uma era de destruição foi iniciada. O elogio à burrice é diário,
estimulado a cada declaração presidencial.
Nenhum
apego ao diálogo franco sendo estimulado. A vivência democrática esvaziada, num
ambiente sem simpatia, convívio estabelecido com o contraditório. Mas sempre pode
piorar.
A nossa sociedade ególatra, pouco empática e
ansiosa pode, num futuro próximo, ter o sonho de cowboy realizado. Os
protótipos de John Wayne, Clint Eastwood podem dar vazão à própria ira,
insensatez, e propagar a ilusão de faroeste tropical pelo país. Provavelmente as
armas serão liberadas, o corte às universidades públicas está anunciado, enquanto o
desmonte da atividade cinematográfica fica planejado. A estupidez venceu.
Para
boa parte da sociedade, a camada das pessoas sem deficiência alguma, começa a
ocorrer uma sinalização comum a todos nós. Própria ao quadro estratificado em nosso cotidiano, há
muito tempo. Desde quando resolvemos encarar a vida. Sabemos habitar o planeta
desigual das oportunidades, arar o solo infértil das chances, com uma teimosia,
uma perseverança cega
Seria
muito melhor, bem mais confortável, caso reinasse um panorama, uma situação menos
conflituosa. Pois eu ainda sonho com o dia, o tempo, no qual possamos andar
pelas ruas despreocupados, sem medo de cair.
Entre
derrotas, quedas, suspiros e vislumbres com um futuro melhor em nossas vidas,
no exercício da nossa militância, aprendemos a conjugar certa habilidade.
Sabemos fazer da falta uma força.
E
em tempos de tempestade, insegurança, a sorte premia os bons navegadores. A
nossa trajetória exige isso, estabelece, de antemão, a necessidade de
desenvolvermos certa espécie de guia, bússola, para atravessar as turbulências.
Já
colocado, sabido sobre a valência essencial de luta para existirmos. E que, de
forma, situação nenhuma, pode nos enganar, seduzir a partir daquele aspecto, da
falácia do pcd servir como exemplo de superação. Mesmo assim, necessário
acrescentar um outro pensamento.
Na
sinfonia múltipla de gestos, jeitos de comunicarmos ao universo soluções para
nossos tipos de deficiência, conseguiremos alcançar a música certa? A sintonia
comum, possível de ser absorvida por todos os nossos corpos e demandas?
Primeiro
é preciso retomar o gosto pela conversa propositiva, de união. Superar
dificuldades não chega a ser qualidade, é um requisito obrigatório para
prosseguirmos. Em meio ao agito, a inclinação por retrocesso, permanecer fiel
à causa, comprometido com a inclusão, será portanto remar contra a maré.
Fundamental
uma reserva extraordinária de fôlego, a cota extra de paciência, para, mesmo
com a ciência da desfaçatez, ainda computar avanços, ganhos para a causa.
O
imã por trás de cada conquista, proveito, talvez venha da falta que nos move.
Um
abraço para todos,
André
Nóbrega.
Emocionante o seu texto André, um sopro de energia para tempos sombrios que vivemos. Parabéns por tamanha lucidez e por colocar os ingredientes necessários na nossa receita de luta.
ResponderExcluirComo sempre, texto lúcido e coerente. Muito bem escrito! Coração apertado, olhos marejados, refletindo sobre a atual situação de nosso país...me solidarizo com sua causa. Nosso povo está cego, surdo e burro. Mesmo assim, não podemos esmorecer, estou contigo nessa luta. Grande abraço.
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