Estava eu, assim, numa tarde chuvosa, mal
parado com a minha cadeira de rodas, bem numa rua do centro da cidade onde eu
não conhecia muita coisa, mas cuja parca acessibilidade não me animava o
espírito.
Era tempos pré-uber,meus amigos,num momento
da minha vida onde não estava ainda apto,com condições físicas a permitir a realização
de muitas atividades.Mal sabia pilotar minha cadeira direito.Portanto,não
conseguia pegar ônibus,muito menos circular por grandes trajetos.
O círculo de programas sociais ficou restrito,
os trabalhos os quais eu conseguia executar eram os famosos,alardeados como home office.Uma
categorização chique,a esconder uma aguda restrição de possibilidades.
Naquele dia, eu começava a entrar numa
fase meio aventureira. Estava predisposto a fazer coisas perigosas para não ser
massacrado pela rotina. Muito menos, queria ficar condicionado ao peso das
lembranças do passado recente. De como tudo era antes da lesão.
Tinha consciência do quanto se tornava urgente fundar outra existência.Nada
do que havia vivido me servia mais.Assim seria por um tempo.
Então,quando uma amiga minha me convidou para
assistir a um show dela,abracei de imediato o convite.Sabia, de antemão, que por
andar em uma área pouco conhecida, e com a ameaça de chuva, as calçadas
poderiam ficar escorregadias, e alterar o controle da minha cadeira.
Creio
que nenhuma transformação surja sem alguns gestos kamikazes.A nossa primavera
só poderá ser curtida depois do convívio com fundamentais invernos.
A nossa independência, o grito de Ypiranga
que quisermos dar, relativo a qualquer área, objetivo nosso, só poderá ser
proclamado após cultivamos um senso de rebeldia.
Porque se o ‘’não’’ passa a ser um requisito
para várias das ações que vivemos, a força para revertemos tantos placares
contrários vem de pequenas insurgências nossas,contra as determinações impostas pelas chances desiguais.
O show da minha amiga foi ótimo. Detestei
esperar tanto tempo para um táxi decidir me atender e resolver não me levar. Quando
a chuva chegou, baixou desesperança, junto com a raiva por depender da boa
vontade de taxistas malandros, um tanto quanto tendenciosos.
Porém, após muita espera, ao chegar em
casa,ficou um sabor de vitória.Porque,de alguma forma,encontrava ali um campo
de germinação em favor do ‘’sim’’.
Como cadeirante, foram 11 quedas, muitos
sustos, e uma certeza.Se eu ficasse no sofá de casa, num diálogo animado junto
com as minhas paredes, eu estaria cerceado.Perderia muita da diversão, da parte louca, inesperada
dos instantes oferecidos quando alimentamos uma saudável iniciativa de
aventura.
Sem saber como a calçada da próxima rua estará
eu sigo, com o mesmo temperamento impetuoso.Somos delimitados pelas lesões, acorrentados
por limites o tempo todo.
Só saberemos onde poderemos chegar se o nosso
atrevimento estiver desperto.Isso é uma tarefa sempre complicada e difícil.
No entanto, existem tantas conquistas a serem obtidas.
O nosso lugar nos pódios ainda vazios, mofados pela falta de oportunidades, aos
poucos vai sendo ocupado.
Porque viver a partir do gosto do risco,do
improvável é também uma arte.Os atores, músicos, já sabem disso faz muito
tempo.
Não acredito muita na
independência sustentada sem uma noção clara de ousadia, coragem para quebrar
os limites impostos por nós mesmos.
Para o castelo, a estrutura de sociedade justa
e igualitária a ser feita, o cimento das nossas capacidades, talentos e
atributos precisa estar reforçado.
Porque, como diria Caetano Veloso,
na letra feita para a música ‘’Divino, maravilhoso’’, do Gilberto Gil:
‘’É preciso estar atento e forte,
não tempos de temer a morte’’
Um abraço para todos,
André Nóbrega.
Texto positivo e encorajador. Uma boa atitude, o ambiente não deve nos afetar e sim, nós é que devemos fazê-lo, promovendo mudanças através da determinação e coragem. Você pode vencer as lutas diárias e fazer a diferença na vida dos outros com a sua experiência e vivência!
ResponderExcluirUm abraço e parabéns pelo Blog. Bjs
Querido amigo André,
ResponderExcluirTodos nós somos movidos a desafios, e estes tem diferentes parâmetros para cada um, fazem parte de nossas individualidades. A maneira como vc encara os seus é estimulantes para os nossos! Obrigada por compartilhar tais momentos. Grande abraço.
Eu ainda tenho medo de sair de casa e me machucar... http://euemdoismundos.blogspot.com.br/
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