24 setembro 2016

O pátio da FACHA


   Existe um lugar onde as barreiras não pesam. Por lá ,os conceitos de inadequação, falta de acessibilidade e inclusão inexistem. Ou , pelo menos, são cargas tão inexpressivas, que não me fazem sentir desconfortável. Pelo contrário, enquanto transito, me locomovo por esse local,é passada uma carga de amor muito grande.

  Falo do pátio da FACHA(a Faculdade Hélio Alonso), localizado em Botafogo. Quando conheci a faculdade, estava bastante receoso. Após muito tempo, com mais de 30 anos, iria fazer outra graduação. Por ser cadeirante, tinha medo de rejeição, de não conseguir me entrosar com a galera da FACHA.

  Estava enganado. O acolhimento foi integral. Existiu sim um abraço sentido desde a primeira semana de aula, durante os trotes. E, para falar a verdade, não houve trote e sim uma ligação direta. Fica até difícil explicar para quem é de fora, mas no pátio da FACHA, a letra da música ‘ ’Tempos Modernos’ ‘,do Lulu Santos, é absorvida de forma integral.

  O começo de um novo começo de era, de gente fina, elegante e sincera está fixado, inserido no DNA dos alunos, incorporada à gentileza dos funcionários da instituição.

  A pessoa com deficiência vive aprisionada por preconceitos, é obrigada a enfrentar condições desiguais para quase tudo na vida. Para aferir correção, tentar nos atribuir um critério possível de nos classificar, muitos recorrem a siglas, a frieza das catalogações para nos definir.

  É tão bom poder ser conhecido pelo nome, ser considerado pelo que eu sou e não pela falta que tenho. Pois no pátio da faculdade onde estudo, trabalho, sinto ocorrer isso. E, na boa, não poderia existir lugar melhor para propiciar um ambiente inclusivo.

 Não é o elevador, o piso tátil, o banheiro adaptado que tornam a minha segunda vivência universitária algo inesquecível. No pátio da FACHA a integração já está sedimentada, amparada por um ambiente que considera, entende a diferença, apoia a singularidade dos seus alunos.

 Um passeio pelo pátio da FACHA nos permite uma aula de tolerância. Aprendo assim mais sobre a diversidade do que em qualquer livro. Lá, o abraço, o sorriso são moedas de troca.

 Convivo com essa atmosfera todos os dias. Saio do campus da faculdade sempre mais leve, pronto para encarar os buracos com outra disposição. O resgate comigo mesmo, com as minhas potencialidades é alimentado por essa galera linda da faculdade.

 Todos nós merecemos um pátio igual ao que encontrei na FACHA. Quando estou na faculdade sinto a acessibilidade estabelecida, determinada como uma prática espontânea, e não como imposição.

 Creio que as maiores revoluções, as grandes mudanças, quando guiadas pelo afeto , alcançam um patamar maior de conscientização .

  O pátio da FACHA, com sua irresistível carga de carinho que me destina, com o volume de empatia inserida todos os dias, é uma inspiração constante.

 Haja esforço, determinação para conseguir surgir nos outros cantos algo similar, parecido ao que ocorre comigo nesse pátio.

 Devagar, nós chegaremos lá.

 Um abraço para todos,


André Nóbrega.


18 setembro 2016

O pódio nosso de cada dia


 Vivemos hoje uma espécie de ressaca. Só que ao invés de dor de cabeça e tristezas pelo que passou, o fim da festa proporcionada pelas Paralimpíadas tem outro sabor.Tem mais a ver com herança do que saudade.

  Somos todos herdeiros do espetáculo visto aqui, no Rio de Janeiro, entre os dias 07 e 18 de setembro. Ainda nos restam muitas barreiras a serem ultrapassadas. Porque as raias do preconceito nos exigem uma superação diária. Haja preparo, disposição para percorremos esta maratona, capaz de consolidar o Brasil como país inclusivo.
  
  Longe dos holofotes nós travamos um pódio. Temos muitas disputas nossas feitas em silêncio, no cotidiano vazio, nada acessível das nossas cidades. Somos todos campeões enquanto buscamos uma forma de vida mais plena e participativa
  
  Sem um estádio cheio a nosso favor, distantes da multidão capaz de vibrar conosco, a cada feito nosso, nós perseguimos feitos ainda inalcançados.
  
  Carregamos uma medalha invisível no peito. Apesar de toda a desigualdade, mesmo com tamanhas dificuldades a gente continua, mantém a intensidade dos esforços. Ambicionamos uma meta mais duradoura, mais difícil que a estabelecida por um atleta, durante um ciclo olímpico.
  
  Não nos esforçamos durante quatro anos para abaixar um tempo. A marca almejada é tão complexa de ser atingida. Embora estejamos atrasados no reconhecimento dos nossos direitos, encontramos uma urgência.
  
  Lutamos contra o relógio, pois, enquanto vivermos, precisamos firmar um diálogo com o futuro. Semeamos um compromisso com a eternidade.  Queremos que todas as pessoas com deficiência no Brasil possam sempre viver melhor.Esse, fundamentalmente, é um plantio para a colheita de gerações futuras.

 O ganho dos nossos paratletas,as mudanças de pensamento trazidas pelas Paralimpíadas. São efeitos a serem repercutidos em muitas memórias, a ecoar na lembrança de inúmeras gerações.
  
 Foram duas semanas que valeram mais do que cem anos de luta. No centro de um evento de importância mundial, para muitos ficaram os exemplos de superação, trazidos pelos personagens principais dos jogos.

  Prefiro pensar que pude estar representado pela mais nobre escala de representatividade. Atletas de alto rendimento puderam mostram ao mundo o quão surpreendente podemos ser.

  E continuamos na luta por mais visibilidade.

 Vamos seguir convictos, perseverantes na luta pela inclusão.

 Um abraço para todos.


 André Nóbrega.


11 setembro 2016

O nosso 11 de setembro.

  O lugar na história para o 11 de setembro está marcado pelo sangue.De imediato,nos remete à destruição do World Trade Center, nos colide com um arsenal de imagens assustadoras daquele dia malogrado pela dor, há quinze anos atrás.

  Para o Chile, então, a data também suscita desgraças. O mesmo 11 de setembro, mas no ano de 1973, marca o início da sangrenta ditadura no país. Associa o período com outras tristes histórias dos governos autoritários latino-americanos da época.

  Existiria um 11 de setembro brasileiro? Algum fato capaz de refletir um acontecimento de mudança da história?

  E se hoje pudéssemos promover, estabelecer com novos fatos o deflagrar da nossa primavera? Mesmo com as ordens de todas as pautas vigentes, do açougue político vindo de Brasília, há uma verdade incontestável: a paralímpiada é um sucesso retumbante. É um fato capaz de encher de orgulho cada brasileiro, de nos fazer voltar a dialogar com outros horizontes.

 Não apagarei da memória as matérias que suscitam a tragédia americana. E, por consciência e apego à democracia, o início do governo Pinochet carece de um cuidado diante dos Trumps,dos vices que nos fazem temer por uma possibilidade de um futuro de reconstrução,que prometem uma mudança abraçada pela mordaça.

 Pela primeira vez estive numa prova dos Jogos Paralímpicos. Já consigo anexar novas memórias à data, porque hoje eu fiquei carregado pelo ideal de humanidade que consagrou o Gandhi , o Martin Luther King.

  Embalado pela amorosidade, segui magnetizado em meio a uma multidão que perfilava um sentimento estranho, abafado pelas tempestuosas crises. Estava lá, de forma clara o motivo que enfim podia promover orgulho ao nosso mal tratado país.

  Nação singular, de tanto baterem na gente desaprendemos a gostar de ti.Perdoe-nos pelo afastamento, mãe gentil, mas essa dor nossa, tão pungente, não há de ser inutilmente.

  O 11 de setembro de 2016 que eu vivi hoje, no Rio de Janeiro, é o mundo onde eu quero estar sempre.

 Terra adorada, a nação dos 45 milhões de pessoas momentaneamente excluídas, germina sonhos prósperos, e o seu futuro espelha essa grandeza.

Verás que um filho teu não foge à luta,enfrenta calçadas perigosas,mas também frequenta pódios e acumula medalhas.

Nossa trajetória está apenas começando.

O melhor ainda está por vir.

Um abraço para todos que acordarão amanhã sob outro efeito,por estarem alimentados com a construção de um Brasil mais inclusivo,


André Nóbrega.


04 setembro 2016

Paralímpiadas,o nosso grito do Ipiranga

 O dia da independência do Brasil neste ano virá recheado, revestido por múltiplos significados. Pois, existe uma sincronia latente entre a data que celebra o país enquanto nação autônoma, soberana com o início dos Jogos Paralímpicos.

 É chegada a hora da nossa causa emitir um urro, formular um gesto capaz de enobrecer toda a nossa história para o reconhecimento das nossas demandas. No dia 07 de setembro começará um novo capítulo na história da nossa inclusão. Que grito do Ipiranga poderia carregar o espírito da nossa luta de forma tão justa, simbólica e retumbante?

 Não pesa nenhuma visão utópica, a considerar que tudo de repente se tornará melhor. Porém, sem dúvida alguma, o espírito de luta, de suor a ser direcionado para as mudanças que almejamos, todo o esforço empregado em nome de uma sociedade inclusiva estará mais bem representado.

 Os paratletas brasileiros representam a consolidação de uma tendência;a cada medalha, a cada recorde conquistado. Nós todos ganharemos uma visibilidade considerável.

 E que representatividade privilegiada será a que teremos entre os dias 07 e 18 de setembro. A fina flor dos campeões, formada pelos brasileiros concentrados para o evento, com certeza, nos orgulhará. 

 O incômodo pódio do preconceito precisa ser abandonado. Aos poucos, a sociedade, já míope com a pobreza de tantas siglas, denominações preocupadas em atender a qual quadro de deficiência nós estamos inseridos, perceberá o óbvio.

 Nós estamos muito além daquilo que nos falta. As costumeiras atribuições a nós feitas como coitados, prima irmã da tendência de achar que somos vítimas do destino sofrerá um abalo. Esse sentimento não terá espaço quando algum campeão nosso, uma atleta brasileira paralímpica subir ao pódio nas próximas semanas.

 Então, para quem é preconceituoso e tem a alma ensebada por uma mentalidade tacanha, a partir do dia 07 de setembro, por favor, reconsidere as suas opiniões. É sempre tempo de melhorar.

  Para todo mundo os Jogos Paralímpicos oferecerão uma chance de melhora íntima. Para alguns, não será surpresa alguma, e sim a afirmação da nossa potencialidade em um estágio pleno.

 Para outros, os jogos cumprirão uma função pedagógica, ao mostrarem que as superações das barreiras, dos limites podem ser feitas de forma tão categórica.
  
 Embora surja a necessidade de fazer uma ressalva.Porque para quem esteja intoxicado por certezas,seja regido por uma maneira limitada de perceber o mundo,e por isso,ainda não tenha racionando algo elementar.

  Aprender com tombos, conviver com as quedas de forma sistemática são fatos com os quais lidamos sempre. No entanto, nós costumamos ultrapassar marcas invisíveis, sem o usufruto de nenhuma medalha.

  No dia 07 começarão os Jogos Paralímpicos do Rio de Janeiro. Será muito mais do que uma festa global, a evidenciar a condição do Brasil como potência paralímpica.

 Começará na quarta-feira o registro para o mundo da nação inclusiva, que algum dia o nosso país poderá se tornar.

 E, apesar das dificuldades, iremos com sede ao pódio.

 Um abraço para todos,


 André Nóbrega.


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