22 janeiro 2016

Pessoa com deficiência - Enquete no grupo do FaceBook .


O QUE VOCÊ ACHA DISSO ?
Em uma reunião onde participavam varias pessoas inclusive pessoas cegas, de repente um dos participantes escreve um "bilhetinho" em um "papelzinho" e esse papel corre na mão de quem enxerga e o cego.... excluído. 
AGORA PASMEM: A reunião tratava dos direitos das pessoas com deficiência e o que foi escrito no papel estava relacionado a pauta.
Em plena semana nacional dos direitos das pessoas com deficiência.
O QUE VOCÊ ACHA DISSO ?

Seja membro do nosso Grupo do FaceBook o maior do Brasil que fala exclusivamente sobre Pessoas com deficiência:

18 janeiro 2016

Sexta-feira no Circo Voador.

  
 Quando tive a minha lesão fiquei confinado a duas prisões. A primeira era definida pela abrupta limitação imposta ao meu corpo. O mundo exterior já não poderia mais ser descoberto,percebido como antes.Foram muitos meses nos quais a movimentação ficou bem restrita. De repente, não conseguia mexer quase nada do pescoço para baixo.Como resultado disso,eu fiquei sujeito a um segundo confinamento.Fiquei preso ao meu próprio corpo,diante de muitas lembranças de como a vida havia sido até então.
  
  Nos primeiros momentos após a lesão tudo foi muito difícil. Eu tive que desenhar em meu imaginário outro modelo de existência, até para conseguir suportar a nova realidade que me foi imposta. Um dos recursos usados era o de fechar os olhos, lembrar somente daqueles instantes de intensa felicidade.Foi feita uma edição, habitada somente pelos meus melhores momentos percorridos.
  
  Outra coisa fundamental foi a visita dos amigos, amigas e o apoio incondicional da família. Mesmo assim, o cotidiano me reservava privações,no mínimo,incômodas. Tomar banho,ir ao banheiro eram tarefas que eu não poderia fazer sozinho,por exemplo.
  
  Era comum eu ser aturdido pelo mesmo sonho, que quando eu acordava se materializava como um autêntico pesadelo. Por muitas noites,eu via o meu corpo correndo,levantando, a fazer tudo o que fazia até um tempo recente, antes da minha lesão. O pesadelo era ter que acordar e ficar paralisado diante da minha realidade.
  
  Passados quase sete anos foram muitos os ganhos físicos acumulados. Mesmo assim, ainda carrego comigo certas limitações.Essas barreiras,porém,mais têm a ver com uma perspectiva limitadora do que com a competência atlética de fazer ou não certas atividades.
  
  Por termos dificuldades para trafegarmos pela rua, usarmos o transporte público com segurança, conforto, nós acabamos por escolher as regiões mais seguras para andarmos. O que é uma decisão pertinente, tendo em vista que a falta de acessibilidade de certos locais nos coloca em perigo. Mas ir sempre aos mesmos lugares também não enche o saco?Não temos o direito de arriscarmos e conhecermos novas opções de lazer?
  
  Na última sexta-feira eu fui presenteado. Consegui voltar ao Circo Voador, assistir a um show da melhor qualidade, na companhia de amigos referenciais em minha vida. Para o Rio de Janeiro, o Circo Voador é um local sagrado. E isso ocorre não somente pelas atrações que ali se apresentam, mas pelo clima obrigatório de alegria, bem estar com os quais a plateia fica imediatamente elevada.
  
  Fazia uns nove anos que eu não ia ao Circo. Não considerava mais esse recanto da diversão em minha rota particular. Julgava que seria difícil de chegar, muito complicado permanecer no lugar, e improvável conseguir me divertir lá como fazia antes.
   
  Estava enganado. Nada obstruiu o meu prazer. A chuva não atrapalhou, a galera que se reunia nos lugares cobertos mais me acolhia do que atrapalhava. O uso do banheiro adaptado era garantido, salvaguardado pelos funcionários do Circo. Nenhum esbarrão foi capaz de diminuir o meu entusiasmo. O sorriso estampado configurava o fim de uma era.
  
  Algumas crenças têm o poder de nos engessar, conseguem tolher as nossas capacidades e obscurecer as nossas potencialidades mais incríveis. E tão sagrado quanto o direito de ir e vir é o dever de brindarmos à vida.

   É fato que temos uma penca de limitações, que os cuidados a serem tomados precisam ser redobrados. No entanto, a precaução jamais pode tolher o nosso desejo por diversão nova. Quando o tédio bater as nossas rodas, precisamos ser tão cuidadosos quanto aventureiros.
  
 Porque o poder das surpresas pode ser reparador. Na última sexta-feira, eu pude reencontrar uma antiga vizinha que é sinônimo de celebração.Ela,além de ter uma alma de trio elétrico,é alguém capaz de sempre elevar os ambientes,contagiar os amigos com a sua presença.

  Quando penso na última sexta-feira no Circo Voador fica uma certeza. As portas da prisão já estavam abertas fazia um bom tempo. A verdade é que eu me contentava em ir ao pátio, e depois tomar algum banho de sol diário. A liberdade das ruas,embora algo possível,não foi ainda alcançada de forma plena.
  
 Nós temos muitas prisões para escaparmos. E cumprimos muitas penas movidas por suposições. A limitação física não define quem a gente é,talvez,indique a necessidade de cuidado para percorrermos certos caminhos.E ser precavido não nos impede de usufruir a riqueza da existência, só nos obriga a sermos criativos e a andarmos com pessoas especiais, que além de gostarem da  gente,tenham essa intimidade com a vida.
  
  Não posso acabar o texto sem agradecer ao Cafi, a Deborah Colker e a Bá Rosalinski pela luz , por me ajudarem a sair de uma prisão que eu não pretendo voltar nunca,mas nunca mais mesmo.
  
  Um abraço para todos,
  
  André Nóbrega.
  

15 janeiro 2016

Acampando em Caraguatatuba-SP - Pessoa com deficiência


No dia 9 de janeiro de 2016 resolvemos fazer uma pequena viajem para descansar um pouco e escolhemos irmos para a praia; Fomos para São Sebastião-SP onde tem várias praias lindas, entre elas a Praia Grande que inclusive tem o projeto praia acessível com equipamentos e monitores preparados para receberem as pessoas com deficiência, infelizmente a praia estava muito lotada e não pudemos nem curtir a água (por opção), Partimos para Maresias e depois voltamos para Caraguatatuba onde ficamos acampados até o dia seguinte 10/01/2016.
Dormimos ao som de uma forte chuva mas graças a Deus não tivemos problemas já que o Camping oferece uma estrutura que protege a barraca.
VEJA O VÍDEO

11 janeiro 2016

Novidades 2016 do Canal Pessoa com deficiência

Professora Maria Gorete Cortez de Assis fará vídeos sobre Educação Especial para o canal Pessoa com Deficiência

10 janeiro 2016

A bruxa que separa as pedras portuguesas

   
  Existe uma bruxa maldita, doida para me derrubar. O feitiço dessa velha não consiste em poções feitas, boa noites cinderelas distribuídos às almas desavisadas, ou rasantes panorâmicos com a vassoura feita para me atropelar. Não, de forma alguma. O poder maligno dessa senhora se apresenta de outra forma.

   Ela tem uma aparência muito mais assustadora das criaturas enrugadas, narigudas dos filmes da nossa infância. O mal que falo aqui é diferente da feiticeira que se transformava em cobra, estava fechada com o capiroto ,e que aparecia no primeiro filme do Conan.A desgraça é ainda pior do que o botox vencido, mostrado pelas apresentadoras de certos programas da TV, durante as tardes. Falo aqui de uma maldição presente à minha vida diária: a bruxa que tira as pedras portuguesas do lugar.

   Porque não é possível. Só pode ser algo sobrenatural haver tantas calçadas assim, mal conservadas, em qualquer lugar, por todos os cantos onde eu passe. A bruxa sabe os lugares pelos quais transito, e com diabólica antecedência. Por isso, trata de atrapalhar o meu caminho. Enquanto não me ver esborrachado no chão, a senhora não vai sossegar.

   Não basta apresentar um caminho difícil, é sempre possível piorá-lo, também. Pois a rua simplesmente complicada pelas pedras portuguesas pode, de repente, virar uma corrida com mais emoção do que qualquer Fórmula 1.Basta chover.E,se quando estiver na rua,logo depois de ter começado uma chuva,eu precise passar por um lugar com pedras portuguesas,você ,então, já sabe quem planejou tudo.Não me surpreenderei se um dia desses,junto com um trovão, eu ouvir uma risada diabólica.

  Tal como a caipirinha, o samba e a jabuticaba, a bruxa que separa as pedras portuguesas é uma característica do Brasil. Ao que saiba, pelas informações por mim recebidas, o asfaltamento de tais pedras em Portugal é diferente. Pelo que consta, as ruas com pedras portuguesas de lá não possuem o mesmo desnivelamento, a falta de cuidado e manutenção das pedras que aqui no Brasil existem.

  Desde então, com o intuito de quebrar o feitiço, tirar a influência dessa presença sempre mal intencionada, que me acompanha sempre, eu adotei uma postura radical.Eu parei de contar piadas a tratarem o Manuel,o Joaquim e a Maria como personagens. Vai que dá certo?

    Uma medida mágica, mas que deveria ser obrigatória seria a de contar com o esforço do poder público. Daí, talvez, de forma séria, contundente pudesse adotar um sistema geral de padronização das calçadas. Tornar a circulação das pessoas uma coisa mais amena, sem que o inconveniente de tantos espaços ruins, difíceis de andar impeça o direito sagrado (e garantido pela Constituição) de ir e vir.

  Eu uso andador e já reclamo da bruxa. Agora, imaginem com o que precisam lidar os cadeirantes, as pessoas com deficiência visual e os idosos com idade bem avançada que circulam pelas cidades brasileiras?Mulheres com salto alto, mães a conduzirem carrinhos de bebês também sentem os feitiços da bruxa que separa as pedras portuguesas.

  E aos amigos que jogam aquele futebol nos finais de semana, cuidado com as dividas, por favor. Qualquer torção no tornozelo sujeita a imobilização parcial da área machucada, se for feita por algum gesso ou tala vai alterar a sua maneira de andar.Aí,então,muito cuidado. Redobre a atenção ao atravessar as ruas e dobrar as esquinas. A bruxa está sempre alerta, esperando por qualquer vacilo seu.

 Creditar a precária condição de acessibilidade ao sobrenatural pode funcionar aqui, para uma crônica. A realidade se impõe de forma bem mais drástica e crua. Mas qual quadro é o mais fantasioso: um mundo paralelo ,habitado por seres fantásticos que atrapalham a manutenção das calçadas ou uma realidade feita por ruas que me integrem ,permita que eu ande para onde quiser, sem me preocupar?

 Ainda creio na integração plena, efetiva das pessoas com deficiência. Mesmo que algumas vezes isso me lembre dum enredo consolidado por divagações, e devaneios, feito o brilhante cenário relatado no romance ‘’Pedro Páramo’’,do escritor mexicano Juan Rulfo.
  
  A leitura dessa obra foi fundamental para inspirar o Gabriel Garcia Marquez.Após isso, o escritor colombiano,ganhador do prêmio Nobel de Literatura em 1982,encontrou novo fôlego ,uma súbita inspiração para prosseguir com a sua carreira como romancista. Garcia Marquez encabeçou um período da literatura conhecido como realismo fantástico.
  
 Que a gente nunca perca o prumo para construir novos caminhos, por mais encrencada, habitada por inevitáveis empecilhos a nossa estrada se apresente.
  
  Um abraço para todos,

  
   André Nóbrega.


02 janeiro 2016

Independência , sem emoção , nem sorte .

  
 Um viva para o Estatuto da Pessoa com Deficiência !


  Amigos de luta, temos motivos de sobra para nos indignarmos. A vontade de mudar, melhorar as nossas vidas, brigarmos por melhores condições de acessibilidade, dá ao sentimento de revolta uma legitimidade. As conquistas derivadas da luta pela inclusão no país têm aparecido. Aos poucos, a acessibilidade vem ganhando um contorno na pauta da política nacional. A partir de hoje, dia 02/01/16, passa a entrar em vigor a Lei Brasileira de Inclusão.

   Estamos diante de um passo considerável, um gol de placa marcado a nosso favor. Porque quando o Direito oficializa uma conquista desse porte, estipula no formato da lei as condutas com as quais os agentes públicos irão criar políticas específicas, ministradas de acordo com as nossas demandas. Porque ,a partir disso, teremos uma base para as futuras cobranças a serem feitas.
 
  O texto da Lei Brasileira de Inclusão  determina, por exemplo, que 3% das casas construídas pelos programas de habitação do governo sejam destinadas às pessoas com deficiência. Ou seja, o ‘’ Minha Casa ,Minha Vida’’ agora terá que abrigar espaço para as nossa rodas , também .Ainda consta do Estatuto uma previsão de auxílio-reclusão às pessoas com deficiência grave ou moderada .
 
  A partir de hoje, quem estacionar indevidamente em vaga especial será penalizado com multa de 129 reais, além de perder quatro pontos na carteira de motorista.,De acordo com a legislação de trânsito,tal falta é classificada como sendo uma infração grave.

  Nas escolas a negativa de matrícula será classificada como crime.Não caberá mais ao diretor das instituições de ensino a prerrogativa de recusar a inclusão do aluno com deficiência nas salas de aula. Pela Lei Brasileira de Inclusão, tal conduta será caracterizada como ato criminoso .Então,restará ao diretor da escola receber as devidas sansões penais, previstas caso a negativa de matrícula se confirmar.
  
  Inclusive, a escola brasileira precisará passar por uma intensa reformulação. Existe um movimento de reação advindo de algumas associações das escolas particulares espalhadas pelo país.Muitos classificam algumas determinações como arbitrárias.
 
   O fato é o que o espaço físico das instituições de ensino necessitará realizar amplas reformas a fim de abrigar os alunos com deficiência que nela estudarem. Além disso, a obrigatoriedade da existência do ledor nas salas de aula também se evoca como um dos direitos conquistados, que finalmente se tornam reconhecidos pela Lei Brasileira de Inclusão para todos nós.

   Porque a existência de um profissional competente,cuja missão é a de passar os conteúdos passados em sala de sala  aos beneficiados por esse direito é fundamental.

  Devemos a Deputada Federal Mara Gabrilli , do PSDB –SP , um sincero apreço pelo brilhante trabalho ao escrever  , formular o texto do Estatuto . Também temos de aplaudir os esforços do Senador Romário Faria, do PSB-RJ , responsável pela tramitação do Estatuto junto ao Senado .

  Porém , a estrada apenas  acabou de ser  liberada . Nós precisamos pavimentar os futuros passos dessa caminhada com cuidado, assumirmos cada vez mais a função de fiscalizar, requerer mais eficácia dos órgãos públicos no cumprimento de assuntos circunstanciais à nossa causa .

  Talvez, demore um pouco até que as intenções elaboradas nesse texto adquiram um aspecto de mudança real. Talvez ainda custe até que a normas estabelecidas para nos atender sejam capazes de assumir uma função reorganizadora na nossa vida.
 
  Se pensarmos nas ruas a serem pavimentadas, nos buracos das calçadas, o conjunto de normas e regras estipulados pela Lei Brasileira de Inclusão não atine ainda para tantas festividades.Já li alguns juristas dizerem  que as conquistas previstas pela Lei só serão absorvidas, inseridas no nosso cotidiano daqui há doze anos.

  Porque são tantas as reivindicações pautadas que a sociedade civil precisará de um tempo para absorvê-las.Isso prova o quanto os fundamentos, os benefeícios que adquirimos pela norma nos serão revolucionários.E não custa lembrar:toda e qualquer mudança significativa na vida de um país, obrigatoriamente passa pelo reconhecimento legal do Estado.

  Portanto, mãos à obra, sempre teremos muito trabalho para fazer valer nossa cidadania de forma plena . 

  Sigamos adiante, fortes, porque precisamos conseguir a nossa independência, termos o direito de atravessar as ruas sem estarmos sujeitos a grandes emoções, e nem contarmos com a sorte para nos equilibrarmos nas calçadas.

 A LBI(Lei Brasileira de Inclusão) reafirma a acessibilidade como o rumo de um caminho inevitável.

 Neste histórico início de ano,brindemos a isso.

 Um abraço para todos ,

André Nóbrega.


28 dezembro 2015

Ser diferente é essencial

  Tal como um sistema de pesos e medidas, existe uma proporção entre a falta de acessibilidade nas ruas e as manifestações de solidariedade, apoio e estranheza que eu recebo e sinto nas pessoas. Sempre haverá a pedra portuguesa solta, colocada em nosso caminho. Isso me mantém ligado, e me obriga a sempre ficar alerta. Mas o que falar da reação de espanto que muitas pessoas têm ao nos verem na noite, curtindo uma festa, por exemplo?

   O andador movido por alguém relativamente novo (estou com 36 anos) é uma cena que ainda mexe com os outros. Com a cadeira de rodas, enquanto circulava sozinho, eu absorvia um painel de emoções pesadas dirigidas a mim. Eram olhares sufocantes de pena, daqueles que o desqualificam mesmo.

  Precisava estar atento aos buracos das ruas e surdo para certas insanidades ditas. Eram muitos os comentários abraçados com uma sentença absurda para a minha vida. Na visão desses iluminados, a cadeira de rodas seria uma espécie de cruz. Então, o meu tempo na terra seria conduzido por um sofrimento contínuo, a existência só poderia me levar a um inevitável abismo.

   Fala sério, nunca fui paciente, nem tolerante com quem apresenta miopia afetiva. Ou então, para os casos graves de cegueira intelectual, também conhecida popularmente como burrice.

   Do outro lado,quando eu menos esperava,fui acometido por manifestações de gentileza incomuns. Sabe a boa ação preservada pelo anonimato?O gesto realizado por um rosto estranho ao seu convívio, mas que tem o poder de lhe transmitir uma nova fé para a humanidade?
  
 Também fui coroado por situações assim. Uma vez, sem jeito, cansado de tocar a minha cadeira-sempre fui mais Rubinho Barrichello do que Ayrton Senna- no meio da rua, com o sinal prestes a abrir  , surgiu um senhor,que me conduziu ao outro lado da rua.
  
  Não satisfeito, ele ainda me perguntou se eu precisaria de ajuda para chegar em casa,se prontificou a parar um táxi para mim e me auxiliou a dobrar a cadeira de rodas, e a me acomodar com plena segurança. Somente depois de já estar seguro,dentro do táxi que o senhor prosseguiu com o seu caminho  .

  Como esquecer aquela moça bonita, nova,que ao me ver perdido no shopping veio falar comigo?Ela fez questão de me localizar, e me conduzir até o meu destino.Nossa,quantas saudades da solidariedade dela. Uma pena eu ter perdido o seu telefone.

 O privilégio de passar despercebido me foi tirado faz algum tempo.Para muitos, a deficiência física contraria a ordem,o senso comum dos movidos por verdades absolutas. A consciência obtida com alguns anos de deficiência é que cumpro uma função pedagógica.

 Os motoristas e trocadores das linhas de ônibus que pego com frequência sabem da minha condição. Vou demorar um pouco mais para subir, me acomodar para seguir viagem com segurança e tranquilidade. O que me felicita é que essa percepção, a consciência do tempo a mais necessário que eu tenho para subir para o ônibus poderá ser assimilada pelos motoristas e trocadores das linhas que utilizo mais. Desta forma, o mesmo cuidado, a mesma atenção será transferida para outra pessoa, com uma deficiência similar a minha.

 Enquanto a diferença não se tornar norma, nós seremos acolhidos como seres exóticos, excluídos do padrão que renega as diferenças e move as sociedades. Portanto, nada mais justo que ocupemos o nosso espaço, e não só ao fazermos valer os nossos direitos civis.

 Temos o dever de exercermos uma desobediência comportamental também. Ser deficiente é uma identidade, o que nos define não é a falta daquilo que não temos, mas sim a luta constante, diária a fim de sabermos até onde iremos.
  
O fato de a inclusão ser uma pauta nova preocupa o fato de ainda sentimos um senso de aventura presente às nossas ações mais simples. Andar na rua, ir ao banheiro dos restaurantes são coisas que nos complicam o viver,mas que não podem nos derrubar.

 A solidão, a falta de interação social é um castigo com o qual nós não devemos aceitar impunemente. Maior que o peso das adversidades deve ser a nossa firmeza em exercer uma cidadania plena.

Devagar, com suor, nós vamos evoluir e obtermos muitas vitórias.

Um bom final de ano para todos!


André Nóbrega. 


21 dezembro 2015

Como endurecer sem perder a ternura?

  
Sabe a poesia oferecida por breves momentos do cotidiano?É aquele presente dado pela vida,quando você menos espera.Em meio àquele dia agitado,com mil coisas a realizar, a cabeça operando por um ritmo frenético , e você vai atravessar a rua. Ao olhar para o outro lado, percebe então uma criança pequena rindo para a mãe.

 De súbito, aquele cenário amoroso o inspira,faz com que o frenesi, o barulho das ruas diminuam o impacto sobre você.Vendo o amor materno sendo passado, poder sentir a singela risada de uma criança toda repleta de carinho o faz atravessar as ruas melhor. Efeito similar ocorre com a aparição e o magnético canto de alguns passarinhos. Isso me convoca a brindar à natureza, assim como quando passo na praia e vejo o voo de alguns pássaros.A impressão que tenho é que esses seres alados me presenteiam com um ballet celestial.

 Talvez,uma das maiores brutalidades da deficiência física é obrigá-lo a se manter em um estado de vigilância constante.Para quem usa cadeira de rodas,muletas ou andador, andar nas ruas é algo complicado.A falta de acessibilidade nos obriga a andarmos tensos. Com tantas ruas esburacadas,calçadas incapazes de nos promoverem segurança, qualquer descuido pode redundar em um tombo.E cair, ninguém gosta,né?

  A preocupação em me manter ileso afasta a capacidade de absorver a poesia da vida. Chego ileso das minhas idas à rua, mas por vezes,bate uma aflição.Porque estou condicionado a uma equação desumana.Olhar para os buracos das ruas é um fator mais importante do que notar a aproximação das pessoas.Tem que haver um meio termo.
  
  A deficiência nos obriga a nos fortalecemos. Porém, nem por isso devemos ceder ao apelo da brutalização permanente, presente nas privações com as quais temos que conviver.Por mais desiguais que sejam as condições de trabalho, de mobilidade e opções de lazer,não ceder à ira,não fazer da revolta uma moeda de troca é um desafio.

  Não fiquei míope ao encantamento, nem mudo para não poder relatar a beleza das coisas que presencio.Mudou a forma de perceber a magia dos singelos momentos do dia a dia. Era uma antes da lesão,passou a ser outra agora.Nem por isso,o destino deixou de me fornecer matéria-prima para fazer poesia.

 Ainda que a rotina de todos nós seja prejudicada pela falta de acessibilidade,pela quantidade de ‘’nãos’’ que juntamos para formatar um ensaio de ‘’sim’’, que o caminho não nos deixe insensíveis às belezas da vida.

 Temos uma vida de luta pela frente,um verão para curtirmos,e um 2016 com Paraolimpíadas e a Lei Brasileira de Inclusão para percorrermos.Vamos firmes,com disposição e abertura para aproveitarmos os cantos de musas,os apelos de festa que nos esperam.

  Um bom Natal para todos!


  André Nóbrega. 



13 dezembro 2015

Praia para todos-Um banho de cidadania.


 Ser um deficiente físico no Rio de Janeiro me segrega. A cidade possui uma série de encantos, um sem número de opções culturais que eu não posso visitar. A acessibilidade é uma pauta nova, um assunto que não foi ainda incorporado pelos gestores de lazer daqui.

   Entre as coisas de que fui tolhido de fazer estava o direito sagrado de ir à praia. Como bom carioca, sempre fui chegado a uma tarde com sol, um bom mergulho no mar para aliviar as minhas tensões, me refazer. Passei um bom tempo convencido de que esse prazer havia cessado da minha vida. Pelo menos, assim vivia até conhecer o Praia para Todos, no verão de 2011.

 Naquela manhã de sábado, em janeiro, eu voltei a nascer. O contato com o mar foi algo capaz de brotar uma capacidade adormecida em mim: a de brindar os meus momentos junto com a vida. O que o Praia para Todos faz com uma pessoa com deficiência física, que fica privada de acessar a praia, é algo fabuloso.

 Quando conhecemos o projeto, passamos a frequentar a empreitada, ficamos ensolarados por novas perspectivas. A cada nova ida à praia nós ficamos capturados por um contexto proveitoso. Logo nos contagiamos pelo Praia para Todos, por ele nos comprovar como a inclusão pode se dar com noções práticas de felicidade.

  Sim, porque o nosso ativismo não deve se sustentar somente pela revolta. A vontade de mudar as coisas, de igualar as condições a que estamos sujeitos move muitos dos nossos propósitos e ensejos por mudança. Muitas vezes, o inconformismo com as situações com de abuso, descaso retém o apelo por uma sociedade inserida por valores genuinamente igualitários, com uma inteiração social calcada na gentileza entre as pessoas. Isso tudo é sentido no Praia para Todos, e com folga.

  A partir do dia 19 de dezembro o Praia para Todos voltará. Será feita na praia da Barra da Tijuca uma grande festa de abertura. Para a alegria dos muitos fãs,colaboradores da empreitada, poderemos fazer da ida à praia uma maneira de celebrar à existência.Mais uma vez , o Praia para Todos nos proporcionará um banho de cidadania.

Em breve, escreverei com mais detalhes sobre o Praia para Todos.

Um abraço para todos.


André Nóbrega.



07 dezembro 2015

Das situações inusitadas.


  Nem só de relatos dramáticos vivemos. Se você usa , ou já utilizou a cadeira de rodas por algum tempo, já acumulou em sua biografia certas situações inusitadas .Infelizmente, o roteiro dos eventos aos quais somos obrigados a compor segue no dia a dia uma trajetória improvável .

 Os tombos que tomei no início da minha lesão foram angustiantes. Não me causaram nenhum dano físico, mas , seguramente, algumas quedas me apavoraram . O temor sentido quando assistia aos filmes da série ‘’Sexta-Feira Treze’’, e a ‘’A hora do pesadelo’’ foram acenos suaves quando comparados aos momentos onde saia de casa com a cadeira. E assim passei a desbravar as ruas sozinho.

 Com o passar do tempo deixei de ser tão ruim de roda. Então, manejar o meu batmóvel acessível passou a ser uma aventura .Incorporei uma vocação de Indiana Jones , a disposição de um Rock Balboa ao me defrontar com obstáculos .Pelo menos, assim pensava antes de sair de casa. Em muitas situações, dava preguiça de ser herói e chamava um táxi para chegar aos lugares. Porém, a rejeição sofrida , a falta de vontade dos taxistas era uma regra . Não tenho dados estatísticos avalizados por uma pesquisa oficial . Mesmo assim, de acordo com as minhas andanças,posso lhes garantir: dois em cada dez motoristas não paravam, passavam batidos , ignoravam a minha sinalização.

 Lembro bem dessa época. Nunca rezei tantos Aves Marias,Pais Nossos enquanto esperava por algum taxista generoso, com vocação humanitária e adepto da política da não violência consagrada por Mathama Gandi e Martin Luther King Jr. Demorava até alguém parar. E não dava nem para manifestar alegria, comoção diante do fato . Mal o carro parasse, não era incomum eu ser fulminado pela seguinte pérola, dita pelo motorista do táxi:’’A cadeira vai junto também?’’. 
  
  Lidar com a falta de noção das pessoas é uma ocorrência frequente,incorporada ao nosso cotidiano. Certa vez, enquanto entrava no ônibus , ouvi uma advertência mal criada, disparada por uma indignada senhorinha:’’Mas como deixam você sair sozinho?”  . A minha resposta veio na lata:’’Se a senhora consegue sair sozinha,por que eu não posso?’’. Pela cara feia dela feita existia em seu íntimo uma clara, manifesta vontade de iniciar uma discussão comigo. No entanto, por intromissão da providência divina , ela desceu no ponto seguinte.
  
  Não me esqueço da vez na qual penei para atravessar a minha cadeira em uma rua de Ipanema . Era um local pouco movimentado. Não poderia ,portanto ,contar com a ajuda de alguém que estivesse passando pelo lugar. Na verdade, havia apenas uma mulher naquele momento, meio longe de mim e que falava ao celular. Após atravessar a rua, subir o meio fio e ganhar a calçada, pude ouvir parte da conversa dela:’’Peraí, eu tava vendo um cadeirante atravessar’’.Sei lá, pode ser que, na infância ,a infeliz criatura não tenha frequentado circos. Porque eu me senti um palhaço no picadeiro.
  
  Não sou adepto da filosofia do ‘’rir para não chorar’’. Para muitas pessoas predomina uma intolerância com a diferença. E de acordo com tais seres para lá de evoluídos, tudo que escapa de uma noção de normalidade lhes indigna , e salta aos olhos.
  
  Ainda que a falta de acessibilidade das ruas não nos ofereça segurança, mesmo que nós tenhamos que nos deparar com gente sem o mínimo de bom senso, eu me recuso a mofar em casa. O apelo das ruas é irresistível , ir ao encontro de amigos , me deparar com momentos inusitados me faz lembrar o quanto a vida pode ser múltipla, diversificada e maravilhosa.
  
  Sim, pois nem só de encontros com pessoas destrambelhadas , em plena sintonia com os seus pensamentos preconceituosos nós vivemos. Tem muita gente bacana, muitos momentos marcantes a nos aguardar enquanto andamos pelas ruas. Mas ,se ficarmos no conforto do lar, perderemos tudo isso.

  Um abraço para todos !

  André Nóbrega.

  



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